Meu Estúdio Maravilhoso
A Despensa de Patsy
Sexta-feira, Novembro 30, 2018

—Humm… que delícia — disse Conley McArdent, de 11 anos, com a boca cheia. — É o melhor pão de minuto que já comi.

— Não exagere — retrucou a irmã, Patsy, de quatorze anos.

— Estou falando sério.

— É mesmo? Foi apenas o de sempre, com os ingredientes de costume: manteiga, farinha, açúcar, etc. Nada especial, exceto a manteiga é claro... é manteiga da Ballyrashane.

— Estão uma delícia — disse Conley esticando o braço em direção ao prato. Patsy segurou a mão dele.

— Esse é o seu quinto, e eu só fiz quatro para cada convidado.

— Opa.

— Tudo bem, Con, já que você é um cliente satisfeito, pode comer.

Os olhos do Conley brilharam.

— Falando de clientes, aposto que poderia vender estes pães.

— O quê? Vender este negócio fuleiro?

— Sim. Você não acha?

— TaIvez — disse Patsy baixinho.

— Talvez? Eu tenho certeza! Você não sabe o dom que tem.

Patsy deu uma risada sarcástica.

— Dom? Pare com isso, Conley McArdent. Eu só gosto de cozinhar — principalmente bolos e biscoitos. E não acho grande coisa fazer uns pãezinhos de minuto que mais parecem biscoitinhos.

— Não diga isso Patsy. Você sempre faz coisas incríveis. E nós dois sabemos que existe biscoito e Biscoito, com B maiúsculo! E você sempre gostou de comer.

— Então isso quer dizer que sou perita no assunto?!

— Talvez. Na verdade, quando estava cozinhando, mamãe entrou e comentou que as pessoas na cidade gostam muito de comprar bolos, tortas e biscoitos caseiros especialmente durante a época de Natal—é tradicional.

— Então coloque mais biscoitos para assar pra nós irmos vender.

— Nós?

— Sim. Ou eu vou vender. Podemos usar uma embalagem legal, e eu posso criar e imprimir uma etiqueta. ‘A Despensa de Patsy’. O que acha?

— Humm, eu não sei, Con. Acho que vai dar muito trabalho. Podemos ver sobre isso. Mas eu acho… você está me deixando empolgada com a ideia.

*

Mais tarde, depois da visita dos amigos de seus pais, Conley entra de supetão no quarto de Patsy, onde ela está trabalhando no computador.

— Você ouviu todo o mundo elogiando seus biscoitos?

— Não. Eu queria terminar este projeto ainda esta noite para poder curtir as férias, mas mamãe me disse que os biscoitos fizeram sucesso.

— Fizeram mesmo. Eu tinha dito que os seus biscoitos são muito gostosos, mas acho que só acreditaram depois de provar. Devia ter visto a cara deles!

— Foi a Patsy quem fez? — eles perguntavam. — É mesmo?

— Sim. E o Merrill — que se acha um “gourmand” — até disse que para uma jovem fazer algo tão tradicional direitinho é preciso ter uma habilidade sobrenatural. Ele usou exatamente essas palavras.

— Pelo amor de Deus — disse Patsy. — Eu só segui o meu instinto... Afinal, fazer biscoitos não é nenhuma ciência.

— Eu ainda acho que podemos vendê-los, Patsy.— Eu suponho, eu suponho — disse Conley, rolando os olhos. —Eu não suponho nada. Você pode rir, mas eu acredito que um dia ‘A Despensa de Patsy’ pode ser um nome conhecido nos lares irlandeses. Pelo menos em Leitrim County! Seja como for, acho que podemos vender muito durante esta época do ano.— Na verdade, mamãe sugeriu que levássemos alguns para o supermercado Scrimp ’n’ Save — disse Patsy com um ligeiro sorriso. —Ela conhece o gerente. Eles fazem uma exposição de bolos e tortas de Natal caseiros, e o dinheiro arrecadado é doado para o instituto Down Syndrome Ireland (Síndrome de Down Irlanda)

— Que maravilha! Então vale a pena tentar, não acha?

Patsy deu de ombros.

— Humm ... Você me deixou um pouco mais empolgada com a ideia. De qualquer forma, vou assar uma quantidade enorme para o Ano Novo, etc., mais à noite.

*

Na manhã seguinte, carregando uma sacola abarrotada, Conley caminhou lentamente para o supermercado Scrimp ’n’ Save. Próximo aos caixas havia uma suntuosa exposição de rolinhos de salsicha, bolos de frutas secas, biscoitos de aveia, tortas de groselha e de amora; e tortinhas de sabores variados. Ele se aproximou de uma das funcionárias e apontou para os produtos em exibição.  

— Estão vendendo bastante?

— Não faço ideia.

— Já experimentou algum?

— Não. Acho legal estarmos promovendo produtos locais, mas como entendo um pouco de culinária, tenho visto que a maioria destes produtos deixa a desejar.

Conley puxou algo para fora da sacola.

— Experimente um destes. São deliciosos!

— ‘A Despensa de Patsy’ — a moça leu baixinho. Quem é Patsy?

— Minha irmã. Foi ela que fez.

— Não estamos sendo um pouco parciais? — disse a moça com um sorriso.

— Olha... o lucro vai para o instituto Down Syndrome Ireland.

— É uma grande causa. Mas será que isso vai melhorar o sabor?

Ela deu uma mordida, enquanto Conley olhava com expectativa. Ela arregalou os olhos.

— Humm … que delícia! — eles derretem na boca. E pelo sabor, ela usou a melhor manteiga irlandesa.

— Sim. Ela disse que usou a melhor.

— Onde ela conseguiu a receita?

— Ela inventou — respondeu Conley com um grande sorriso. —Simplesmente foi juntando os ingredientes.

— Genial. Olha só, podemos fazer o seguinte ... qual é seu nome?

— McArdent. Conley McArdent.

— Edna McKeen. Olha só, Conley, para começar, podemos chegar aqui para o lado alguns destes produtos e fazer espaço para os biscoitos da sua irmã aqui na frente.

— Ótimo. Eu tenho um montão aqui.

— Vamos começar com alguns pacotes, está certo? E vou colocar uns pedacinhos em uma bandeja para degustação. E vou comer mais um, só para garantir...

Após agradecer a Edna, Conley saiu do supermercado em direção ao correio onde ia enviar alguns cartões postais. Enquanto esperava na fila, o homem atrás dele perguntou:

— O que você está saboreando aí, meu filho? — O homem estava com rosto, mãos e macacão sujos, mas seu olhar era bondoso. — Pelo jeito está uma delícia.

— É um biscoito que a minha irmã fez.

— Que legal. São bons?

— Divinos. Experimente um.

— Estou com as mãos um pouco sujas.

— Não tem problema. Os biscoitos estão embalados.

A Despensa de Patsy — disse o homem lendo a etiqueta. Rasgou o invólucro, deu uma mordida e sorriu de orelha a orelha.

— Nossa... uma verdadeira delícia. Estão à venda?

Conley fez que sim com a cabeça.

— Vinte e cinco cêntimos cada um. Cinco por um euro. O lucro vai para o Down Syndrome Ireland.

— Meu irmão tem uma filha com síndrome de Down — disse o homem enfiando a mão no bolso. — Vou levar vinte pra começar. Veja só, está na hora do almoço, e os rapazes na oficina iam adorar esses seus biscoitos. Se for lá vai esvaziar essa sacola num abrir e fechar de olhos.

Conley enviou seus cartões, esperou o homem pagar uma conta, e depois o acompanhou até a uma oficina mecânica do outro lado da rua.

— Eu nem me apresentei — disse o homem — sou Brendan Brogan.

— Conley McArdent.

— Esta é a minha equipe — disse Brendan cumprimentando alegremente alguns homens em macacões manchados de óleo que se encontravam sentados em pneus, capôs de carros e encostados no barraco enquanto comiam suas marmitas.

— Desculpe pessoal. Ele é o nosso capataz — brincou um, enquanto Brendan apresentava Conley.— O que você tem nessa sacola, Conley? — um deles perguntou. Parece que está carregando a casa nas costas!

— São biscoitos feitos pela irmã dele — explicou Brendan.

— É pra vender?

— Isso aí. Acabei de comprar vinte unidades. São ótimos com um café. E o melhor é que o lucro é pra uma boa causa … DSI.

*

Com a mochila vazia, a carteira cheia e um grande sorriso, Conley caminhava tranquilamente para casa quando alguém o chamou do outro lado da rua. Edna McKeen estava na frente do Scrimp ’n’ Save. Conley correu até lá.

— Ei, quero mais algumas dúzias de — começou a dizer, mas seu rosto marcado de sardas entristeceu — parece que a sua mochila está vazia.

— Está mesmo. Por quê? Vendeu todos os que deixei com você?

— Praticamente. Só dei umas amostras de degustação para os fregueses que estavam no supermercado. Esses biscoitos estão saindo que nem, ah... bolinhos quentes! Até peguei encomendas de uns cinquenta. Uma pessoa até voltou e perguntou se tínhamos outros produtos da Despensa de Patsy.

— Que ótimo. Vou falar para a minha irmã agora mesmo.

— E diga para ela fazer muitos — disse Edna piscando o olho. — O Natal está chegando, nós queremos ficar gordinhos e a Despensa de Patsy e o instituto DSI vão precisar pôr mãos à obra!

— Obrigado, Edna — disse Conley e saiu correndo. —Feliz Natal!

— Para você também!

— Mamãe… Mamãe! O que aconteceu com os biscoitos que eu fiquei fazendo até de madrugada? Sumiram praticamente todos.

A mãe de Patsy encolheu os ombros. A única coisa que eu sei é que Conley levou um monte para o quarto dele hoje de manhã antes de sair.

— Por quê? Ele estava com fome?

— Não acho, porque ele traçou um farto café da manhã irlandês! Ele estava lá em cima mexendo com a impressora por um bom tempo.

Patsy correu lá em cima e voltou à cozinha alguns minutos depois.

—Parece que vou ter que fazer mais — disse ela, vestindo o casaco. —Vou ter que ir rapidinho no Scrimp ’n’ Save para comprar mais manteiga Ballyrashane antes de fecharem.

— É bom ver você ter um pouco de iniciativa.

— Iniciativa, mãe?

— Isso mesmo. Levantar-se e se motivar que nem o seu irmão.

Patsy suspirou. Ela tinha ouvido sermões suficientes sobre automotivação não tão sutis, inculcados através de podcasts durante o café da manhã, supostamente para seu próprio bem.

— Por que é que Conley sempre tem o que eu não tenho, por mais que eu me esforce?

A mãe de Patsy encolheu os ombros.

— Algumas pessoas têm essas coisas naturalmente e outras não. Essas outras têm que aprender.

Patsy estava prestes a sair da cozinha em desespero, mas parou e sorriu.

— Falando de motivação, você sabe o que Con tem que eu poderia ter?

A mãe de Patsy encolheu de novo os ombros.

— Não sei. Mas o que eu acho, querida, é que você subestima seu valor.

— Em quê, por exemplo?

— Na culinária... no forno, por exemplo. Você se lembra daqueles pãezinhos com linguiça incríveis que você fez com massa folhada para o aniversário do papai?

— Lembro. Mas saber fazer biscoitos não é nada para se orgulhar.

—Perceber o seu próprio valor não é se gabar, principalmente se reconhece Deus na situação. Qualquer coisa menos do que isso é falsa humildade, na minha opinião, um sentimento muito mesquinho.

Patsy meneou afirmativamente a cabeça. Você tem razão, mãe... eu acho.

— Mas, diga-me uma coisa — disse a mãe de Patsy, segurando a mão dela. — Exatamente o que é que Conley tem que você poderia ter?

—Bem, você sabe o que você e o papai sempre me lembram em relação ao Natal?

—O quê?

—O Natal é sobre os outros, certo? Não sobre nós.

—É verdade, querida, mas onde você está querendo chegar?

—Falo com você mais tarde, mãe. Até daqui a pouco.

Quando Patsy foi pagar o que comprou no Scrimp ’n’ Save, era Edna McKeen que estava no caixa.

— Vejo que você está comprando a melhor manteiga cremosa da Irlanda. Imagino que vai fazer bolos ou biscoitos — comentou Edna.

— Vou mesmo.

— Já experimentou estes biscoitos? —perguntou Edna, apontando para uma bandeja com pedacinhos de biscoitos para degustação.

— Creio que não.

— Receita incrível. Usa este mesmo tipo de manteiga. Experimente um.

Patsy deu uma mordida e seus olhos começaram a brilhar.

— Nada mal … na verdade é delicioso. Dá vontade de desistir de cozinhar.

— Eu também — disse Edna.

— Quem os fez? — perguntou Patsy.

Edna deu-lhe um pacote de biscoitos, e Patsy ficou de boca aberta.

— Você... quer dizer que são os meus?

— São mesmo? Você é a ‘Patsy’?

Patsy fez que sim com a cabeça e seus olhos se encheram de lágrimas, enquanto analisava a etiqueta bem elaborada.

— Você não sabia?

Patsy fez que não com a cabeça.

— Então pode agradecer ao seu irmão — disse Edna. Como eu falei para ele, estão saindo que nem bolinhos quentes, então é melhor começar a fazer mais! Aqui está o seu troco, Patsy, e tenha um Feliz Natal.

— Feliz Natal — respondeu Patsy distraidamente, e saiu do supermercado.

*

Alguns dias mais tarde, em honra da participação espontânea dos moradores da cidade em várias campanhas humanitárias, inclusive aqueles que doaram seus talentos culinários, os holofotes estavam centrados no supermercado Scrimp ’n’ Save na véspera do Ano Novo. Com microfone e anotações em mãos, Patsy sorriu nervosa para as câmeras e compradores que a rodeavam.

— Pelo que fui informada, Srta. McArdent — disse uma repórter do noticiário local — considerando que é tão jovem, sua empresa de bolos e biscoitos contribuiu de forma substancial este ano para a angariação de fundos do Instituto Down Syndrome Ireland. A que se deve isso?

— Ao que tudo indica, eu fiz um excelente lote de biscoitos, bolos e outras coisas gostosas — respondeu Patsy com um sorriso e fez sinal a Conley para se juntar a ela.

— Fez mesmo — gritou uma mulher. —Eu vou encomendar mais de todos os produtos.

— Muito obrigada. Mas, para ser franca, o mérito pelo sucesso da Despensa de Patsy deve ir para o meu irmão Conley, que está aqui ao meu lado, e o seu entusiasmo. Como disse para a minha mãe um dia destes, mais importante do que ele ter motivação, é que se ele não fosse alguém que também motiva outras pessoas, os meus produtos nunca sairiam da mesa de uma cozinha dentro das quatro paredes de uma casa minúscula na rua Donahue!

— E eu espero e oro, pela graça do bom Senhor — acrescentou Patsy depois de uma parada para a audiência rir e aplaudir — que apesar de eu não ter muita motivação, possa pelo menos inspirar os outros! Aqui, Conley, diga algumas palavras.

 Conley, ficou vermelho e pegou o microfone.

— Muitíssimo obrigado, irmãzinha — e dirigiu-se à multidão. —Devo dizer que Patsy não só contribuiu com os fundos, mas também dedicou a maior parte dos dias das suas preciosas férias a cozinhar! E tudo isto para dizer que estamos orgulhosos e felizes de ter contribuído com a campanha do Instituto Down Syndrome Ireland, do qual nossos pais são membros. Desejamos a todos vocês um feliz Ano Novo! E, a propósito, podem adquirir mais produtos da Despensa de Patsy na seção de confeitaria.

Autoria de Gilbert Fenton. Ilustrações de Jeremy. Design de Roy Evans.
Publicado pelo My Wonder Studio. Copyright © 2018 por A Família Internacional
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Tagged: natal, excelência, determinação