Meu Estúdio Maravilhoso
Presentes de Natal Disfarçados
Sexta-feira, Dezembro 23, 2016

O Natal começava a despontar representado pelas dobraduras de papel verde e vermelho na forma de folhinhas de azevinho exibidas pelos proprietários de lojas em suas vitrines. Entrando no carro com meu pai ao volante e na companhia de meus irmãos a caminho das tão esperadas compras de Natal, eu sorria ao ver aquelas figuras de avôs gorduchos e sorridentes recortados em papel. Enquanto saíamos da garagem os meus pensamentos giravam em torno do que eu queria comprar: um perfume com uma fragrância gostosa para minha mãe, um relógio estiloso para o meu irmão mais velho, uma boneca fofa para minha irmãzinha... e assim por diante. Eu estava explodindo de alegria, e mal conseguia esperar até chegarmos ao shopping... onde nunca chegamos. 

Na metade do caminho tivemos um acidente. Apesar de ninguém ter se machucado, a moça que pilotava a moto que bateu na traseira do nosso carro sofreu escoriações e foi levada para o hospital mais próximo. Os pensamentos do Natal se dissiparam no meio de telefonemas, ligações para o hospital e delegacia, e todos os formulários a serem preenchidos e documentação a ser providenciada, algo que se estendeu por semanas.

Quando finalmente todos os detalhes foram resolvidos, eu sentia que o acidente tinha devorado a melhor época do Natal, deixando apenas algumas “migalhas” para eu saborear antes da virada do ano. Mas mesmo assim estava decidida a desfrutar ao máximo dessas migalhas, por isso fui ajudar minha mãe a preparar a ceia de Natal. Meu pai e irmãos também participaram e rimos, conversamos e cantamos canções de Natal. A única coisa que me deixava triste era o fato de Evelyn, minha irmã mais velha, estar doente no quarto, apesar de ela ter garantido que até à noite se sentiria melhor. Finalmente parecia Natal! Mas, novamente, as coisas não aconteceram como eu esperava.

No final da tarde uma surpresa! Ouvimos Evelyn vomitando no banheiro, encolhida com uma forte dor no abdômen. Meu pai a levou imediatamente para o hospital mais próximo. Um sentimento de medo, desespero e choque começou a me inundar, enquanto via os faróis do carro se distanciarem da casa. Toda a animação do Natal se desvaneceu junto com o por do sol. A ceia ficou por terminar. A alegria e sentimento festivo que eu tanto aguardava sumiram deixando-me sem entender a razão de tudo aquilo. Por quê? Eu me perguntava. Por que justamente agora? Por que com ela?

Minha mãe reuniu a família e oramos fervorosamente rogando a Deus que cuidasse da Evelyn. Já era quase meia noite quando meu pai ligou avisando que ela tinha sido operada para a retirada de um cisto necrosado supurado e que estava tudo bem. Ela estava sã e salva! Ali, na penumbra da sala de estar, com lágrimas nos olhos e sorrindo aliviados, nós nos abraçamos sob a luz do pisca pisca da árvore de Natal. Eu desmaiei na cama, consumida de preocupação por Evelyn e orando por sua rápida recuperação. Aqueles pensamentos de que o meu Natal tinha sido “arruinado” sumiram.

No dia seguinte, acordei com uma nuvem negra de desapontamento e frustração. Levantei-me e fui quietinha à sala de estar, onde fiquei sentada perto da janela observando a iluminação das ruas na escuridão da noite. Com o desgaste das últimas semanas, combinado com o pânico da noite anterior, eu nem conseguia mais pensar em presentes de Natal e botinhas. Acho que não vou ganhar nada este ano, eu me lamuriava. Pensei na minha irmã acordando no hospital e imaginei a dor e o choque pelo qual estaria passando.

Este Natal tem sido um horror! pensei um pouco emburrada enquanto recolhia um enfeite caído da árvore de Natal.

Sentada com o enfeite reluzindo na mão, comecei a pensar que, na verdade, eu já tinha recebido vários presentes de Natal, só que não os que eu esperava. Eu tinha ganhado um apreço renovado pela minha família, empatia por vítimas de acidentes automobilísticos, gratidão pelo fato do nosso acidente ter sido mínimo, alegria pela cirurgia da minha irmã ter sido um sucesso... e muito mais.

Pensei na alegria de rever minha irmã e como daria muito mais valor a ela depois de quase perdê-la. Eu também sabia que, a partir dali, ficaria grata cada vez que minha mãe voltasse em segurança do mercado, cada tarde quando descesse do escolar na frente da minha casa, e cada noite quando papai voltasse do trabalho em segurança. Eu nunca mais teria por garantida nenhuma “saída rápida” de carro para ir a algum lugar.

Fiquei animada e comecei a sorrir. Alegria e paz espantaram a tristeza e a dor. Eu pedia a Deus para conseguir me esforçar mais para demonstrar amor e apreço por cada membro da minha família no ano que entrava – apesar das divergências ou briguinhas. Decidi que, em vez de perfumes, relógios ou bonecas, eu me empenharia em lhes dar de presente paciência, atenção, gentileza e compreensão. E também resolvi valorizar mais a vida e cuidar melhor do meu corpo. Afinal, tudo o que aconteceu nesta época de Natal deixou claro que vida e saúde são tesouros frágeis e lindos que não podemos desperdiçar nem ter por garantidos.

Os dourados raios do sol esmaeciam no horizonte enquanto eu pensava no primeiro Natal. Talvez Maria e José tivessem esperanças e planos amorosos sobre como honrar o seu primogênito com as melhores acomodações e confortos ao nascer. — E como o decreto do César interrompeu seus planos! Eles devem ter ficado bastante sentidos ao serem recusados como hóspedes em uma estalagem após a outra! Como devem ter ficado tristes, cansados e desconsolados ao verem o sujo e fedorento estábulo onde se hospedariam! Todos os seus planos se desmoronaram um a um, como aconteceu com o meu Natal “perfeito”. Exaustos e frustrados como devem ter se sentido, talvez nem tenham percebido que o seu recém-nascido viria a salvar a humanidade e mudar o curso da história. Mas naquela noite, envolvido em trapos, e deitado em uma tosca manjedoura rodeado de animais mal cheirosos, veio ao mundo o maior presente de Deus.

Autoria de Elsa S., adaptado. Publicado originalmente no Just1Thing. Ilustrações de Yoko Matsuoka. Design de Stefan Merour.
Publicado pelo My Wonder Studio. Copyright © 2016 por A Família Internacional
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Tagged: natal, gratidão